Bondade é força, generosidade é força. A ideia de força que parece prevalecer atualmente se liga à ideia de acúmulo: acúmulo de dinheiro, de poder político, de saúde, de influência, de atenção (engagement talvez seja a palavra mais adequada). Tudo pode ser acumulado e tornar-se fonte de força e poder. Quem caminha no sentido contrário não tem como meta a acumulação, mas a concessão, a dádiva — que se opõem à acumulação. A mesma dádiva que nos alimenta quando podemos receber os amigos e amigas (e os amores), ouvi-los, fazê-los mais alegres. Uma vontade de servir, servir de bom grado, uma alegria em servir. Algo muito diferente do gosto por ser servido que manifestam os acumuladores (especialmente no Brasil, onde o fetiche de ser servido é marcante na vida social). Mas a força da dádiva é exigente, exige um tipo de capacidade aparentemente sem valor simbólico, mas que não podemos deixar de reconhecer quando sentimos sua presença. É preciso excesso pra ter essa força. Ou melhor, essa não é uma força que se pode ter ou possuir, porque toda força que se deixa possuir é limitada pelo capacidade do portador. Como se o portador de um poder ou de uma força fosse um recipiente com um/a limite/capacidade de acúmulo e armazenamento. A força da generosidade consiste precisamente em que ela não seja acumulativa e, portanto, não sofra com os limites de um portador (recipiente) limitado. O poder que não se pode portar é muito maior que qualquer poder que se pode acumular. Pra participar desse poder precisamos ser pessoas que não se tornam pobres, por mais que concedam. A força da dádiva é a força da amizade, da partilha, do entendimento que transcende quadros normativos.
Curiosamente, é o mesmo tipo de força que move a luta pelo conhecimento livre.