Meu presidente Luis Inácio Lula da Silva

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Em filosofia, como em outras áreas, há quem dissimule incompetência e inabilidade sob o manto de um linguajar técnico restrito a poucos. Há mesmo quem pense que a expressão rigorosamente técnica, sisuda, corresponde a um indicativo inegável de domínio sobre um tema ou sobre um campo específico.

Pois bem, no domingo à noite, em entrevista ao Canal Livre, o presidente Lula apresentou-se como de costume: com suas metáforas, analogias e exemplos. Acima de tudo, estava ali um homem de presença e caráter esmagadores. Talvez vocês não estivessem atentos às coisas que eu atinei. Naquela sala o que eu vi foram homens que, com dúvidas e questionamentos, reagiam com admiração e até certa simpatia ao modo como o presidente respondia às suas questões. É certo que todos conhecem Lula, entrevistado por eles em outras oportunidades. Mas ali à frente havia outro homem, de força e especialmente de uma segurança sem igual. Mesmo Boris Casoy, entre um e outro sorriso debochado, contendo-se para não partilhar do humor popular do presidente, vez ou outra era flagrado rindo honestamente de suas tiradas.

Isso não quer dizer que ele tenha se saído magnificamente em todos os momentos. À questão quanto à reforma trabalhista, respondeu furtivamente. Eu mesmo lhe teria perguntando o que impediu, no ano passado, um queda brusca na taxa básica de juros (a níveis aceitáveis), já que a crise era uma arma mais que suficiente para impedir a possível ameaça de inflação. Há pontos cegos na administração federal e muitas críticas legítimas podem ser levantadas.

Apontar o simbolismo da entrevista e do comportamento de seus entrevistadores não é imunizar o presidente de toda crítica. A possibilidade de indicar dificuldades e apontar críticas, contudo, não é argumento contra qualquer governo. Significativa é a segurança com que mesmo os obstáculos são administrados e expostos — pois não há dúvida que eles existem, e sempre existirão.

No tempo em que lhe foi concedido, Lula demonstrou muito mais do que a segurança reiterada aqui. Ele exibiu serenidade e a espirituosidade habitual. É fascinante perceber como um ex-torneiro mecânico, malgrado a crença elitista dos formados em centros de excelência acadêmica, pode dominar com destreza invejável uma gama incontável de conceitos políticos e econômicos. E mais: como é capaz de traduzir esses conceitos numa linguagem clara e acessível — sem qualquer prejuízo conceitual — para arrepio dos protointelectuais, congelados no tempo em que se advogava que determinadas palavras e escolhas vocabulares eram mais adequadas que outras para representar o modo como as coisas são. Em verdade, esse conservadorismo da linguagem é apenas uma faceta dos instrumentos de controle forjados para perpetuar a ideia de que determinados campos devem se manter restritos aos técnicos e iniciados. Lula intimida porque escancara essa falácia neocoronelista, e aproxima a política do povo. Suas decisões e ponderações são postas aos alcance de quem se pensava incapaz de opinar em terrenos antes restritos. E não adiantar sugerir que suas posições são criticáveis, errôneas ou falsas. Mesmo os mais prestigiados intelectuais tem ou tiveram opositores. É possível mesmo afirmar e confirmar que algumas de suas premissas estão erradas, mas é claro para qualquer pessoa minimamente atenta que, sob as simplificações e analogias que ele mobiliza, há ideias sólidas, bem articuladas e nada simplórias. Há um domínio expressivo dos conceitos e de todas as questões em jogo.

O presidente Lula tem muitos erros, mas um dos seus mais destacados acertos é não ter se intimidado diante do terrorismo criado em razão da sua baixa escolaridade e dos seus constantes erros de concordância. Desse modo ele conseguiu engendrar uma linguagem própria, seus próprios meios para chegar ao povo e dialogar com ele, sem os vícios e os preconceitos que contaminam a visão de quem acha que a política é uma ciência, no sentido técnico. Lula trouxe a política pro terreno pragmático e com suas analogias fez entender o peso e consequência de suas decisões. As simplificações são efeito de uma escolha metodológica, de um tipo de abordagem. Diante dos entrevistadores do Canal Livre, como antes em muitas outras oportunidades, seus expedientes se mostraram eficazes como sempre. A argumentação envolve muitos níveis de conhecimento e variáveis diversas concorrem para a sucesso de uma linha de defesa. Ela não se resume a uma cálculo técnico, a uma mero cálculo de proposições — isso o Feyerabend já havia notado. Lula, apesar da ingenua imagem que apenas os mais tolos detratores fazem dele, é um mestre no domínio dessas variáveis, de sorte que sua presença, num campo de debate, é quase sempre de uma contundência incontornável. Ele sabe como cativar o público, como jogar com a audiência.

No final das contas, resta apenas admitir que eu sentirei falta do meu presidente. Quem quer que o suceda, não substituirá o espírito, a presença e a segurança que ele transmite mesmo aos que se opõe a ele. Será uma perda e tanto.

1 comentário

  • Petição MIL: Lula da Silva a Secretário-Geral da ONU

    A todas as Autoridades Políticas da Comunidade Lusófona

    Reconhecendo o grande prestígio internacional justamente granjeado
    pelo Presidente do Brasil, Lula da Silva, o MIL: Movimento
    Internacional Lusófono defende que ele seja proposto, pelos Estados e
    regiões de expressão e tradição lusófona, para próximo
    Secretário-Geral da ONU: Organização das Nações Unidas.

    Não se podendo recandidatar ao cargo que ocupa, uma pessoa com o seu
    grande prestígio internacional não deverá ficar, pura e simplesmente,
    desaproveitada. A sua eleição como Secretário-Geral da ONU seria,
    também, o reconhecimento da cada vez maior importância da Comunidade
    Lusófona – e, em particular, do Brasil – à escala global. E seria,
    sobretudo, uma boa notícia para o mundo.

    Primeiro subscritor: Fernando Nobre

    Para subscrever a Petição:

    http://luladasilva.movimentolusofono.org

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