Alguns tipos me intimidam. Uma amiga, de quem já fui mais próximo, é um bom exemplo de um desses tipos. Bonita (pelo menos para mim: antes que os conhecidos façam objeções), charmosa, inteligente e algo misteriosa. Apesar do comércio filosófico e literário que havia entre nós, oferecendo alguma afinidade, um obstáculo causava embaraço. Ela é descrente quanto as coisas do amor. Essa caraterística...
Entre o gênio e bom trabalhador
Durante toda a minha vida acreditei no trabalho. Por isso, quando quis escrever — e escrever bem, como os bons escritores — cuidei de observar atentamente o modo como os mestres organizaram seus trabalhos. A maneira como encadeavam os períodos, a medida exata de cada recurso, o tom, se podemos falar assim, do discurso — tudo isso a fim de criar uma regra geral que pudesse me instruir...
Estratégias de sedução
O plano de argumentação de alguns colunistas é digno de interesse — especialmente o de Diogo Mainardi. Sua estratégia reduz-se a uma simples regra geral: afirmar que a mais contundente arma da inteligência é meramente destrutiva. Comentei um texto no qual o professor João Carlos sublinha essa face, ou melhor, esse emprego da inteligência — aliás, esse texto é imensamente adequado ao tema desse...
O riso totalitário
A Melancolia de Durër Encontrei o blog de Antônio Cícero, o que não pode deixar de ser algo interessante. Ele compila por lá escritos seus e de outros autores. Já no começo achei o texto de Inês Pedrosa, O império do anticonvencional — muito interessante! Ele me recordou uma nota mental: não é de hoje eu que sou da opinião de que o riso, a alegria, a felicidade, enfim, todos os sentimentos...
O desafio de libertar homens livres
Marcuse opera uma distinção valiosa entre repressão e mais-repressão. Ele admite que uma cota de repressão é necessária para coordenar as finalidades algo dispersas do instinto (Trieb) aos propósitos da cultura (Kultur). O desvio promovido pela mais-repressão introduz-se exatamente nesse espaço e se contamina com a legitimidade destinada à repressão. A mais-repressão, a repressão orientada pelo...
Sobre enganados e enganadores
Esse post foi motivado pela conversa com Danillo Ferreira, nos comentários. Minha ressalva ao fragmento de Serres, no post anterior, foi insuficiente. Não deixei clara minha posição. Trata-se de não aceitar a clivagem artificial entre enganados e enganadores — de perceber que nesse jogo há variáveis que não admitem ser cifradas numa configuração binária. A responsabilidade deve ser...
Causo cotidiano
Enquanto esperava as horas reservadas àqueles que dependem do transporte público em Salvador estive atento a minha volta. Uma atenção incomum, propiciada pelo clima ameno e pelo Arrah and the Ferns. Fixei-me em três garotos, de 5 a 8 anos, que brincavam em plena avenida Oceânica (em frente ao Hotel da Bahia). Brincavam com o que a rua lhes oferecia — galhos, folhas secas e sobretudo garrafas de...
Ilusões e prisões femininas
Eis aqui consumada minha promessa de escrever sobre as ilusões femininas. Temo não agradar aqueles que não vêem diferenças entre preconceitos e generalizações. Creiam, elas existem. Todo preconceito é uma generalização, mas nem toda generalização é um preconceito. A esse respeito talvez seja de algum valor a leitura do meu comentário sobre a importância das generalizações para a experiência comum...
O amor implica a posse
Tenho uma amiga que insiste em defender a opinião de que o amor dispensa a posse. Nesse terreno eu sou conservador e sustento a opinião contrária. Antes de mais nada é preciso lembrar que o amor é um sentimento social que comporta a sensualidade mas também a afeição. As relações duradouras que o amor promove são alimentadas pela afeição. Se a sexualidade fosse dirigida somente pela consecução do...
Não fazes falta a ninguém
Que vício deplorável o de escrever ébrio, ou ao menos num estado de excitação alcoólica semelhante — para que eu não caia na classe dessas figuras que se embriagam por qualquer coisa. Tanto melhor! assim estou mais preparado para atender às exigências do mestre Baudelaire, a quem coube o ofício de prescrever os deveres do bom ébrio. Eu, que nunca tive caráter para fugir à regra, entrego-me...