No trabalho — como na vida particular — as pessoas fingem o tempo todo. Fingem que sabem, fingem que entendem, porque não querem parecer estúpidas aos olhos dos outros (estúpido é quem não sabe, não como elas que sabem tudo). Eu que não sou bom fingindo estava sempre constatando minha incompetência, minha ignorância, comparada aos outros. Mas constatar que os outros fingem e que a vida é um teatro em que as pessoas encenam suas vidas (e seus personagens) tem um efeito libertador, porque ninguém é nunca tão bom quanto finge ser. E como a maioria finge, sobram poucos que efetivamente podem exibir quem realmente são — ou que são efetivamente bons em qualquer coisa. Diante desse teatro montado pela mediocridade, eu descobri que posso ser muito melhor em tudo, inclusive no fingimento.
Porque se as pessoas se dão por satisfeitas com o ridículo teatro que a maioria encena para os outros, eu posso fingir muito, muito melhor, com o mínimo esforço. Se por um lado isso me dá liberdade de não me preocupar com coisas que antes me preocupavam, por outro reforça o sentido de minha solidão, da constatação de que os encontros são coisas difíceis, não podem ser programados nem antecipados. São uma sorte, um kairós, como diziam os gregos.
A ideia de fingimento e importância que eu dou à ideia de encenação vem de duas fontes, a principal, Erving Goffman e sua preciosa “A representação do eu na vida cotidiana”, mas também de um surpreendente uso de Wittgenstein que descobri com o professor Allan Janik, que mesclou engenhosamente a pragmática de Wittgenstein à ideia de dramaturgia, num texto sugerido (que eu nunca cheguei a ler) em que ele menciona a expressão epistemologia do drama. Profundamente wittgensteiniano!