O gosto pelo mórbido

O

Tirei essa foto em 2022, em numa praia em A Guardia, na Galícia. Assim que despontamos na curva da rua onde está a praia vi os policiais e logo o corpo coberto. Saquei o smartphone do bolso imediatamente e tirei a foto antes que alguém notasse minha condição de freak. Desci para a praia menos curioso para ver o morto do que a reação à sua presença.

Era indisfarçável não apenas uma curiosidade, mas uma excitação que as pessoas dissimulavam em nome do respeito que a circunstância devia inspirar. Minha cara era de indisfarçável deleite, pois eu constatava dissimulado em cada rosto o mesmo interesse pelo macabro e pelo mórbido que eu tinha desde jovem. Hipócritas, pensava.

A civilização mascara desejos e sentimentos nada civilizados, que as pessoas não admitem, mas que só precisam encontrar as circunstâncias apropriadas para vir a tona. O Nevoeiro encena uma dessas circunstâncias. Fogueiras, enforcamentos, linchamentos, será que tudo isso nos é verdadeiramente estranho? Não creio que precisamos ser civilizados no sentido de não sentir desejos mórbidos, macabros ou bizarros. Não acho nem sequer que os homens devem abandonar seu natural gosto pela crueldade, mas que todos estes desejos habitem nosso inconsciente e conduzam inconscientemente nossas ações, isso sim é apavorante.

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