Orgulhosa ignorância (ou o fetiche da opinião)

O
Uma das muitas simplificações que circulam sem reservas no Facebook

A internet é uma ferramenta e como tal está sujeita ao bom e ao mau uso. As exigências postas pela rede, pela conectividade e abundância de informação parecem solicitar que cada ponta dessa trama esteja de alguma maneira ligada a todo o seu emaranhado. Tem-se a impressão de que conectividade da rede solicita que cada sujeito, informado imediatamente de fatos e acontecimentos por mais remotos e distantes que eles estejam, opine ou forme opinião o quanto antes sobre tais eventos.

Assim nasce a injunção que tem dado oportunidade a manifestações constantes de uma ignorância manifesta quase com orgulho por pessoas que, em outras circunstâncias, não se acanhariam em manter-se caladas. É como se a rede lhes instasse a tomar partido e, por consequência, parece natural que, na ausência de análise mais apurada, os resultados acabem por produzir dicotomias que não traduzem a complexidade dos temas abordados, simplificações que aplainam questões antes difíceis, como se por esse meio fosse pretendido torná-las mais operáveis, maleáveis aos novos e apressados opinadores que, na pressa de exibir nas redes sociais suas opiniões, esqueceram do papel político que elas carregam.

É o fetiche da opinião.

Esse é o efeito lastimável da internet com o qual eu espero um dia nós possamos aprender a lidar (pois, é claro, não se trata de lamentar o passado, mas de aprender a lidar com o presente). Do contrário, só nos resta essa sensação de perda:

Antes as pessoas tinham mais pudor, vergonha do que lhes ia na alma. Cuidavam de manter a boçalidade algo recolhida, para não passar vexame. Não era bonito exibir publicamente a própria estupidez

É preciso salientar que o problema não é a opinião em si, pois numa sociedade democrática ela tem um lugar central, mas esse imperativo da opinião que constrange e induz a formação de opinião mesmo quando não se tem elementos bastantes para opinar. Assim, o que antes se ligava essencialmente a liberdade de pensamento agora parece vincular-se a uma necessidade de pensamento que cobra de cada um uma posição sobre os mais variados temas que circulam na internet e faz com que o impulso a falar (ainda que bobagens) seja menos vexatório que a tendência a calar, a não participar.

2 comentários

  • Não sei, não. Eu acho que havia pensamentos mal elaborados, superficiais. Mas condutas, propriamente, eram poucas.

    É com o nascimento desse imperativo que faz com que opinião seja mais que um gesto político, mas acima de tudo um ato social, no sentido de um ato que visa status, que é mera exibição e não consciência de uma relação (política).

Por Leonardo Bernardes

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