Notícias e comentários para entender os ataques israelenses

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Depois de ler o comentário de Rafael sobre o massacre em Gaza, resolvi reunir links que ajudam a entender o porquê da revolta contra a ação israelense. Os comentários abaixo podem ou não manter relações com os parágrafos anteriores. Quero apenas destacar informações a serem pesadas para uma avaliação precisa do que está acontecendo por lá.

Diferentes tipos de sofrimento.

Entre os que apoiam os ataques de Israel não há quem não lamente a morte de civis palestinos. No entanto, eles insistem em sublinhar a intranquilidade e a insegurança das cidades ao sul de Israel como pretexto para a carnificina em curso. Difícil não duvidar da sinceridade dessas lamentações. Quem se importa efetivamente com a vida de civis não está disposto a resolver o problema da insegurança impondo a outro povo um problema ainda maior. Os israelenses devem mesmo estar cansados do estado de constante intranquilidade, pois apoiam incondicionalmente uma investida que mata sem distinção. Se você defende a morte como solução política, é preciso ao menos hombridade para admiti-lo. A covardia israelense se duplica quando, além de matar centenas, os seus defensores escrevem hipocritamente em blogs e caixas de comentários que lamentam e se importam com as perdas civis. Como se essa importância não produzisse o compromisso de não submeter os outros a situações que não desejamos para nós mesmos.

Cora Ronai declara, no texto comentado por Rafael, que mortos e feridos israelenses não são filmados nem fotografados. Uma imensa mentira, pois mesmo os soldados, que por ofício correm risco de vida, quando mortos ou feridos, são elevados à condição de heróis e seus nomes são divulgados e se transformam em ícones e instrumentos de manipulação. Entretanto, a razão pela qual Cora não vê vídeos de israelenses mortos é porque eles praticamente não existem. 4 civis mortos desde que começou o ataque e 23 ao longo de quase 5 anos (considerando civis, claro). A falta de imagens de mortos e feridos israelenses, da qual Cora se ressente, é apenas a expressão da esmagadora discrepância que há entre Israel e Gaza e não o produto de manipulações antissionistas.

Um número bem mais preocupante, que supera em muito as baixas civis israelense.

O brilhante Ali Kamel saiu em defesa dos israelense. Observou que o Hamas, apesar de eleito democraticamente, prega a teocracia e por isso deveria ser acompanhado de perto. O Hamas propõe o fim de Israel, ao elegê-lo, o povo palestino aprovou a estratégia política do grupo e aceitou as consequências, pensou Kamel, quase justificando a morte dos civis palestinos. Guardião da democracia no Oriente Médio, Israel enxergava outras vias que não passavam pelo extremismo do Hamas: como o Fatah, que “pregava a saída de Israel dos territórios ocupados em 1967, a criação de um Estado Palestino com sua capital em Jerusalém e uma solução para os refugiados de 1948 com base em resoluções da ONU”. O mesmo Fatah contra o qual o Hamas foi lançado, com ajuda israelense. O que me leva a pensar que efetivamente Israel não tem nenhuma intenção de admitir um estado palestino. Embora em aparência zelosos defensores da democracia, nas questões internas os israelenses não têm por ela o mesmo apreço. Os que se recusam a endossar os ataques contra Gaza sofrem grande pressão e os que se recusam a participar são presos (como é o caso dos Shministim). Em Israel, a dignidade e o livre arbítrio não fazem parte do pacote da democracia. Os partidos políticos árabes foram impedidos de participar das eleições gerais em fevereiro. Os árabes perfazem 20% da população. Um exemplo de espírito democrático, não é verdade? Uma democracia ditatorial, invenção israelense. Uma dúvida razoável, há Constituição em Israel?

Desde outubro um membro do exército israelense já havia alertado para o uso desproporcional de força que seria investido nos próximos conflitos. O major israelense declarou:

We will wield disproportionate power against every village from which shots are fired on Israel, and cause immense damage and destruction. From our perspective, these are military bases,” he said. “This isn’t a suggestion. This is a plan that has already been authorized.” (…) The answer to rocket and missile threats from Syria, Lebanon and the Gaza Strip, he believes, is “a disproportionate strike at the heart of the enemy’s weak spot, in which efforts to hurt launch capability are secondary. As soon as the conflict breaks out, the IDF will have to operate in a rapid, determined, powerful and disproportionate way against the enemy’s actions.”

A ofensiva já havia sido planejada há tempos. Meses antes. Os foguetes do Hamas serviram de pretexto previamente calculado para emprestar “legitimidade” ao conflito. A tese da autodeseja é um total nonsense, lógica e juridicamente.

Aqueles que levantam a voz contra Israel são logo denunciados como antissemitas, pró terroristas e coisas afins. O maniqueísmo é a arma mais utilizada pelos defensores de Israel. Como se a revolta diante da morte indiscriminada de civis consumada por um país desenvolvido, politicamente organizado e executada por um dos exércitos mais poderosos do mundo fosse algo mais do que a manifestação espontânea de humanidade. As mortes e a insegurança que afetam os moradores das cidades ao sul não são justificadas, entretanto, também não servem de pretexto para assassinatos sistemático. Sobre isso, quero fazer um parêntese. Considerando o ideal ascético Nietzsche (Genealogia da moral, III, § 13) chega a uma posição paradoxal à primeira vista: a idealização e o distanciamento da vida real e material são artifícios para preservação da vida e não o contrário. É o esgotamento, a exaustão fisiológica que leva ao instinto de cura que dispara uma luta pela existência. Em tempos de sofrimento, doença e privação, todos dispositivos concorrem para preservar o valor da vida, mesmo o mais radical deles, a negação. Para entender, e apenas entender, as vias políticas adotadas na faixa de Gaza é preciso ter em conta a condição doentia a qual está sujeito aquele povo. Colonizados, enjaulados, submetidos a constrangimentos e privações de toda sorte, o cerco israelense vai enformando a alma cansada dos palestinos. Crianças crescem subnutridas, em um contexto socio-político que debilita seus corpos e seus espíritos. O fechamento das vias políticas e a intensificação dos bloqueios e controles israelenses dispara uma resposta atávica. A degradação constante, contínua, acirra a luta pela vida e explica mesmo a adoção de políticas extremas. Na iminência da degeneração, do desaparecimento, o homem reage quase por instinto, como um animal que, preso e ferido, reune forças inexplicáveis para lançar uma última investida contra seu algoz. Essa é uma imagem, não justifica a morte de civis e o lançamento de foguetes do Hamas — as toupeiras costumam prendre-se a leituras simplificadoras e ignorar analogias a fim de escapar dos argumentos — mas entender o contexto e as rotas políticas recentes exige que tenhamos plena consciência do estado doentio, de esgotamento, que Israel impõe aos palestinos através do cerco, da colonização e dos bloqueiros, e, portanto, de sua responsabilidade pela radicalização das estratégias políticas em Gaza contra a qual agora ela investe violentamente. Por isso mesmo a ação militar israelense já está previamente fracassada; ela é cega para esse impulso vital que jamais cessará de existir enquanto as condições degradantes não forem suprimidas. Desestruturar o Hamas não é o bastante para impedir que novos ataques aconteçam (Gaza não é o Líbano), é preciso desarticular as condições que conduzem ao radicalismo e o primeiro passo nesse caminho é abandonar o bloqueio que embota a vida dos palestinos. Enquanto eles se sentirem ameaçados pela constante degradação, com ou sem estrutura militar, haverá sempre quem esteja disposto a uma ação violenta e extremada. Aliás, a verdade desse impulso se desenha nos inúmeros escritos psicológicos que tentam explicar a passividade dos judeus diante da morte. Usada quer pelo Hamas, quer por Israel, a morte nunca é uma estratégia política legítima. A violência física e psicológica resultante da esgotamento imposto aos palestinos pelas medidas israelenses torna ainda mais absurdo o massacre em Gaza. Israel não pode fugir às suas responbilidades pela radicalização do conflito e pela ascensão do Hamas. Contra a doença que Israel infunde em Gaza, e que consome gradativamente os palestinos, não é de estranhar a radicalização. Imaginar que o assassinato de civis é uma resposta apropriada a ela é esquecer cinicamente a parcela de culpa de Israel e ignorar as diferenças entre a saudável e organizada sociedade israelense e a sociedade palestina, quase em completo colapso por consequência das políticas israelenses.

Israel tem usados todas as armas na ofensiva em Gaza, sem poupar esforços. Um soldado comentou o uso de armamento contendo fósforo branco, apesar da negativa oficial.

One soldier sent to Gaza recently said that he had handled phosphorus grenades and that tanks equipped with white phosphorus shells were in operation. “We’ve been using it responsibly . . . it’s been around the whole time,” he said.

O analista militar da Human Rights Watch, Marc Garlasco, enviado a Israel para investigar o uso de armas ilícitas, não pôde entrar em Gaza, mas deixou uma descrição que nos interessa.

There are two ways to use the bombs: The first is to impact them on the ground, in which case the resulting thick smokescreen covers a limited area; the second way is an airburst of a bomb, which contains 116 wafers doused in phosphorus. The moment the bomb blows up and the phosphorus comes in contact with oxygen – it ignites. This is what creates the “fireworks” and billows of jellyfish-shaped smoke.

Alguma semelhança? Imagens do boston.com

Há ainda o uso de DIME, Dense Inert Metal Explosive, e de outras armas (como urânio empobrecido) cuja verificação não pode ser feita porque Israel não permite a entrada de jornalistas, nem representantes de entidades internacionais (ver verbete no Wikipedia sobre DIME).

Israel bombardeou uma Universidade, um hospital, escolas, prédios públicos, delegacias, mesquistas, ambulâncias, um prédio e duas escolas da ONU, e um edifício de agências de notícia internacionais. Alegando uma ação coordenada para desarticular o Hamas, o exército destruiu por completo a estrutura da sociedade em Gaza. Quando questionadas sobre os ataques, as autoridades afirmaram que a IDF reagiu aos disparados de militantes do Hamas. Foi assim no episódio da escola da ONU (embora depois tenha sido negado, UN: IDF officers admitted there was no gunfire from Gaza school which was shelled). Foi assim no recente caso dos ataques ao prédio da ONU. Eles nunca erram, apenas respondem à ação dos “terroristas”. Mas o Haaretz documenta casos como esse:

With fighting all around them, Israel Defense Forces troops knocked on the door of the Samouni clan in Gaza City last weekend and told them to leave, directing them to the building owned by a relative. Twenty-four hours later, three shells slammed into the structure where dozens of people were huddling, according to survivor accounts Friday.

Essas são algumas pistas com as quais se deve contar para formar juízo sobre o massacre israelenses — ou a Solução Final para o problema palestino. Não se deve perder de vista, por fim, as manipulações operados ao início do conflito, na tentativa de transmitir a falsa imagem de ataques cirúrgicos. A medida que a verdade foi se mostrando, elas cessaram.

Todas as notícias que cataloguei estão registradas no Delicious, nas seguintes tags: israel, gaza, UN, palestine, guardian, haaretz e muitas outras relacionadas.

Atualização 1: Fresh evidence of Israeli phosphorus use in Gaza emerges

Atualização 2: Um vídeo esclarecedor, com imagens e pronunciamentos relevantes. Eu fico cá me perguntando: será que os israelenses pensam que seus ancestrais, aqueles que sofreram o horror nazista, será que eles estariam orgulhosos do que foi feito com Gaza? De forma alguma!

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