Eu me considero uma pessoa vingativa. Isto é, sempre que penso o que faria com qualquer um que ferisse uma pessoa amada sem esforço minha imaginação transforma o Malleus Maleficarum numa cartilha de boas maneiras. É naturalmente compreensível o desejo de ferir e magoar quem quer que tenha ferido e magoado as pessoas que estimamos. E a lei reconhece isso, ou seja, as atitudes motivadas pela pathos que inspiram os sentimentos numa circunstância em que pessoas amadas foram alvo de crimes podem ser atenuadas ou, a depender da situação, tornadas integralmente inimputáveis.
Mas uma coisa é reação que sentimos ou imaginamos diante de um crime, outra bem distinta é o fundamento das respostas que o Estado precisa dar ao crime e aos criminosos. Se você confunde as duas coisas o resultado é o elogio à violência policial e a apologia à truculência como única abordagem na lida com uma questão complexa como a criminalidade.
O que sobra é uma mentalidade punitivista, vingativa, frente a qual qualquer direito concedido a criminosos é privilégio inaceitável e desumanidade. Estranho parâmetro: só são humanos os que aceitam que certos humanos não tem direitos humanos — pois são animais! É longo o caminho que temos que percorrer para construir um país onde um criminoso possa ser visto como um homem com direitos inalienáveis. Ideias como essa pareceriam normais se viessem de um cidadão qualquer, provenientes da cabeça do presidente da Comissão de Direito Humanos e Minorias são um triste e sintomático signo. Esse pensamento dominante desemboca na indiferença a casos absurdos como aquele no qual um preso foi torturado, ficou cego e tetraplégico sob aplausos de uma multidão.
Se a indiferença à vida e aos direitos de um criminoso é o caminho para o progresso e para um estágio de civilização tal como aspirado pelo gênio Marco Feliciano, então estamos no caminho certo. Caso contrário, talvez convenha ter em mente que justiça e vingança são duas coisas flagrantemente distintas.