Por seis votos contra cinco, o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou nesta quinta-feira (29) as pesquisas científicas com células-tronco embrionárias sem nenhuma restrição, como previsto na Lei de Biossegurança.
Encerrado o debate, vale destacar a versatilidade da argumentação do ministro Celso de Mello. Prático, ele afirmou taxativamente:
Desculpem-me a expressão, mas o destino de todos esses embriões seria o lixo sanitário. Dá-se-lhes, portanto, uma destinação nobre.
Ao mesmo tempo foi sofisticado para buscar em outras fontes o índice para a incoerência da postura dos religiosos:
Ele cita a idéia de que a alma só entra no corpo humano durante o nascimento, esposada por Platão em “A República”, bem como opiniões semelhantes de Aristóteles e do escritor romano Sêneca.
O propósito da digressão erudita de Mello é mostrar como a Igreja Católica apoiou durante muito tempo visões parecidas com a dos autores clássicos. Na verdade, diz ele, o aborto em fases iniciais da gravidez teria sido tolerado até o século 16.
Ironicamente, nos anos 1860, o Papa Pio IX estabeleceu a concepção como ponto inicial da vida humana graças justamente às descobertas da ciência da época sobre a embriologia humana.
Considerando que nem todo ato sexual resulta em gravidez, é justo admitir que a Igreja não tem a menor idéia de quando efetivamente acontece a concepção. Ela precisa do suporte instrumental da ciência para defender suas posições. Ensinada a olhar a vida pelas lentes da ciência, seria no mínimo estranho admitir a leitura religiosa sem considerar que ela mesma é um dos subprodutos da atividade científica. Descobertas futuras ainda provocarão maiores alterações no conceito de vida que, embora tenha uma projeção empírica, não pode cristalizar-se sob pena de impedir o desenvolvimento de novas teorias mais adequadas para explicar os fenômenos e para resolver problemas aparentemente insolúveis.
Por acaso Kennedy Alencar também escreveu sobre o ministro: Dá-lhe, Celso de Mello!. Nota-se, pelo que ele relata, uma tentativa de escamotear o conservadorismo em ressalvas que quase inviabilizariam1 as pesquisas.
Sobre esse assunto, leia também:
Mais duas notas sobre a questão das células-tronco
Atualizações:
Votaram pela improcedência da ação os ministros Carlos Ayres Britto (relator), Ellen Gracie, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio e Celso de Mello. Igualmente favoráveis às pesquisas, porém com restrições, em diferentes níveis, votaram os ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e Gilmar Mendes.
Notícias do STF. No final das contas, então, ninguém votou contra. Tá bom, conta outra!
Mais duas notícias:
Veja íntegra de votos dos ministros do STF sobre pesquisas com embriões
1 Restrições propostas por ministros inviabilizam pesquisa com embriões, diz pesquisador