Eu concordo com aspectos da avaliação que se tem feito da proposta de acordo entre Brasil e Irã. É óbvio que os movimentos do governo brasileiro tem como matriz a ambição de conquistar um papel mais destacado na arena de decisões políticas internacionais. É certo também que o novo papel almejado pelo Brasil tem gerado rusgas com o governo americano. Brazil’s Iran Diplomacy Worries U.S. Officials:
But the effort [o esforço para evitar um novo Iraque] is hardly a selfless one, analysts say, arguing that Mr. da Silva sees the Iran talks as a way to stand against American dominance and advance Brazil’s emergence as a major player on the international stage.
In that new role — which rests largely on Brazil’s position as South America’s largest economy — the enormously popular Mr. da Silva has challenged the United States on everything from trade and climate change to last year’s coup in Honduras to Washington’s longstanding embargo against Cuba.
Se essa nova postura produzirá consequências sensíveis, ainda não é certo. Tampouco é possível determinar a extensão delas. Mesmo que o governo brasileiro saia vitorioso nesse episódio, é possível que o gesto de autonomia seja recebido com preocupação. É natural que se reavalie a relação com o país que não é mais um mero amplificador na agenda internacional americana.
Bem, se o Irã tem mesmo interesses pacíficos, aceitar a proposta brasileira é a melhor alternativa. Aceitá-la significa minar um pouco do poder político americano. Se não parece convincente a ideia de que o poder americano possa se retrair à força de algo dessa natureza, eu coloco de outra forma: com a ascensão do Brasil e a vitória de uma tese calcada na mediação e no diálogo, a já combalida capacidade americana de lidar com questões políticas envolvendo aquela região receberá uma dura estocada. O ceticismo americano pareceria então simples má vontade. Pro Brasil, esse jogo é arriscado e de apostas altas. É certamente um movimento ambicioso e válido tão somente pela auto-estima que reflete. Mas a vitória seria ainda melhor, uma bela munição para atingir um inimigo que tem errado sistematicamente sempre que questionado sobre assuntos internacionais. Para o Irã, seria uma maneira de atingir os Estados Unidos, sem ônus. Pra dizer a verdade, ainda que fins belicistas alimentem as pretensões iranianas, a proposta brasileira parece uma alternativa mais produtiva e eficiente de golpear os americanos. Nesse acordo, todos sairiam ganhando.
Fontes iranianas negam o encontro e suas consequências. É esperar a confirmação da notícia no dia de hoje ou nos próximos dias.
Atualização – É como eu disse:
Mr. Obama now faces a vexing choice. If he walks away from this deal, it will look like he is rejecting an agreement similar to one he was willing to sign eight months ago. But if he accepts it, many of the urgent issues he has said will have to be resolved with Iran in coming months — mostly over suspected weapons work — will be put on hold for a year or more. Many American officials believe that is Iran’s most pressing goal.
Gostaria de fazer só dois comentários:
1) quais as garantias que o irã dá de que que todo o material nuclear deles será entregue, antes de virar combustível e depois desse combustível for usado, de modo que se possa controlar o que ele, irã, está fazendo?;
2) quais as garantias de que o irã irá cumprir esse acordo, de modo a realmente assegurar um irã nuclear mas pacífico? Qual o seu tempo de implementação? Há como já implementar desde já medidas que no sentido de fiscalizar o irã, antes mesmo da entrega de combustível?
Se não há essas garantias, considero que ainda que seja uma vitória pessoal do lula, não aplacará as dúvidas sobre um irã nuclear, o que pode transformar numa vitória de pirro esse acordo.
Julio,
Os termos do acordo ainda são uma incógnita. É claro que é preciso se cercar de todos os cuidados possíveis. Mas o acordo ele mesmo deve e tem que ser um ato de boa vontade, por mais cuidadoso que seja. Isso significa que nós não podemos afastar todas as dúvidas que recaem sobre o Irã. Nenhuma instrução legal vai contornar nossas incertezas motivadas pelo comportamento do governo iranianos nos últimos anos. No entanto, se esse contexto for um empecilho à crença de o país possa cumprir o acordado, formalmente nós nunca teremos meios de lidar com o Irã senão por intermédio de sanções e coisas do gênero, entende?
Colocando de outro modo: o que nós poderíamos chamar de garantias de que o Irã não agirá como tem agido no governo Ahmadinejah? A resposta: absolutamente nada. Se essa é uma exigência a ser levada a ferro e fogo, nunca seremos capazes de agir senão através de meios não-diplomáticos. O acordo começa na aposta de uma mudança e toda mudança tem um início (claro, não creio numa mudança radical, mesmo o meu texto, o que ele salienta é uma mudança ESTRATÉGICA).
É arriscado apostar somente nesse tipo de instrumento. Os riscos realmente existem, mas nesse contexto, apesar de todo cuidado, é preciso corrê-los.