Afiançar a vida a uma aposta provável é pretensão que não me arrogo. Não aconselho uma vida de excessos, o pleno desregramento, mas, tampouco sugiro solene respeito às cartilhas nutricionais. O equilíbrio é quase sempre bem-vindo.
Se me excedo ao longo da vida e a velhice me alcança — talvez até antes disso todos os transtornos principiem — é provável que se precipite sobre mim o peso de anos de abandono indolente. Se ao contrário me policio e guardo alimentação regular, moderada, observando as cartilhas nutricionais, é provável que eu goze uma velhice serena. Tais posições extremas devem contar com um elemento comum: o avançar dos anos. Só a longevidade confere legitimidade à crítica ao excesso e ao elogio moderação. No entanto, convenhamos, não parece pretensioso o desígnio que antecipa em tanto anos a forma do futuro? E se as coisas não correrem como esperamos, terá valido a pena resignar-se ante aquele belo prato de carne do sol frita com manteiga de garrafa, torresmos e aimpim frito?
Sou, desde sempre, lamentavelmente barroco para enlaçar minha vida em promessas futuras. Somado a isso, assalta-me um cristianismo de conveniência que me infunde uma humildade inaudita, impedindo-me assim de erguer o olhar para além do meu limitado horizonte. No final das contas, eu não consigo encontrar nenhum ponto firme que justifique tanta fé no futuro, sobretudo, nada que me faça abdicar do prazer imediato de comer, beber com amigos, etc. Também a oscilação das instruções científicas estimula a desconfiança. Gastronomia é cultura e talvez uma das partes dela que mais me agrada.
Sou seguidor do mestre João Ubaldo Ribeiro e ele, melhor do que eu, defendeu a tese da nossa escola com destreza inigualável. Se você quer alguns minutos de uma leitura agradável, esclarecedora, leia o texto dele (abaixo). Sempre que quero rir e/ou renovar as minhas forças combalidas pela luta diária contra nutricionistas militantes, leio essa coluna, que retém algumas verdade sob o véu do humor.