Eu me recuso a debater esse assunto pelo ângulo da ideologia. Ideologia demais emburrece. Eu quero discutir o caso da Companhia Vale do Rio Doce pelos critérios do management e do business na iniciativa privada.
Trocando em miúdos, Alon diz que a venda da Vale pode ser contestada mesmo sob o prisma das categorias que coordenam o mercado financeiro (ainda que na macro-esfera). Como bom jornalista, ele apressa-se em fugir à parte estritamente teórica e aos entraves que ela dispõe. No caso de Alon, que é uma exceção à regra, não é por falta de competência que as coisas assim se passam, mas por um sentido de praticidade que quase sempre se perde quando os debatedores se encaminham para uma contenda teórica.
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Alijado dos compromissos jornalísticos, eu prefiro, ao contrário, repercutir o preterido. Deixem que eu torne claro meu ponto de partida: não sou favorável à estatização das empresas, nos moldes da mais fiel agenda comunista, mas, tampouco sou partidário da idéia de um Estado mínimo. Em verdade, minha posição no que respeita a esse dois conceitos não é outra coisa senão o resultado de um confronto entre suas formas e realidade histórica do Brasil.
Não me ocuparei com exposição das razões pelas quais a estatização é inadequada ao nosso Estado. Cada um parece dominar com destreza incomparável as armas para combater essa perspectiva. O que me transtorna é o açodamento com o qual se descarta qualquer tema relativo às empresas estatais. Tenho a impressão de que a Petrobrás é argentina, de que todas as experiências com empresas estatais malograram e que, portanto, desvincular-se desse fardo é um imperativo a ser realizado por cada governo.
Observem bem, admito e exijo que existam os que discordem tanto do meu posicionamento quanto daquele ostentado pelo mais sectário comunista. O que não tolero é a refutação gratuita e imediata de argumentos contrários baseada na certeza incondicional da impropriedade dessas posições.
(mesmo o falsificacionismo que contornando os problemas relativos à forquilha de Hume [Hume’s fork], pretendeu dar à ciência um solo mais estável através da coordenação dos esforços científicos centrados num procedimento lógico necessário, a negação [modus tollens], sofreu críticas, pois se expunha a contingência da verdade das premissas que operava, ou seja, ainda que a conclusão preservasse a verdade das premissas necessariamente, ainda dependia da necessidade de que elas fossem verdadeiras. O falsificacionismo, desse modo, não poderia escapar da revisão histórica de suas premissas)
O falsificacionismo é fragmentado e meu adendo não pretende representar o pensamento de todos os seus componentes, portanto tomem-no somente como ilustração de que mesmo em ciência, o maior emblema da objetividade humana, as proposições não são estimadas necessariamente objetivas sem prejuízo.
Rechaçar antecipadamente o debate sobre a participação e relativização do Estado no domínio do empreendimento industrial é arrogar-se um direito que nem mesmo a ciência logrou ter para si. É conferir a um ponto de vista o estatuto de inquestionável. Que sejamos sensatos ao menos para nos manter atentos aos argumentos das partes interessadas e saibamos, a título de precaução, que as diferenças entre o Brasil e os demais paises exigem que os modelos políticos sejam revisados e adaptados as nossas necessidades. Repetir de maneira intransigente a cartilha de modelos internacionais, para mim, em nada difere de evangelizar em praças públicas. O dogmatismo de tais práticas desde sempre apresentou-se como o maior inimigo do desenvolvimento humano e da democracia.
É preciso guardar a possibilidade de que estejamos errados, como condição imprescindível para que o debate transcorra nos termos mais elementares não só do âmbito político, mas racional. Isso, aliás, eu digo sempre e nos mais diversos textos, seja quando falo de amor, seja de litetura, filosofia, etc.