O Estadão e os blogs

O

Estadão faz campanha contra os blogs

Eis o dilema: combater uma tentativa furtiva de enfraquecer a credibilidade de um veículo cada vez mais forte ou se alinhar junto aqueles que julgam a contestação a uma simples campanha publicitária a expressão da atividade de uma patrulha ideológica.

As duas posições têm suas vantagens. Vejamos.

Não é preciso esforço para imaginar que a liberdade e diversidade inerentes as condições de produção e divulgação de textos na internet estorvam a manutenção de alguns veículos comunicação (em termos comerciais) e sua função no cenário político nacional. Não sem razão o fenômeno mundial repete-se no Brasil e a imprensa escrita é chamada adaptar seu conteúdo aos padrões da mídia eletrônica. Parece curioso, porém, que o objetivo de uma peça publicitária seja alcançado pela via da rasa desfiguração de uma classe. Será que o conteúdo daquele jornal é tal que não tem valor próprio, demandando, para obter seu valor, uma comparação com um domínio onde o amadorismo prevalece? O que se sucede dessa comparação por certo não é o descrédito da blogosfera. Pessoas bem informadas sabem dos rigorosos crivos com as quais devem estar munidas para adentrar esse domínio, contudo, hesitam em reduzi-lo a suas formas gerais, sob pena de restringir uma autêntica ferramenta dos novos tempos, útil e produtiva, à imagem comum que identificamos no seu uso costumeiro. É de fato tentador enxergar nesse mecanismo indireto de promoção uma ocasião para desprestigiar um espaço que ameaça a voz uníssona da imprensa escrita — em se tratando da imprensa brasileira, é quase imperativo inferir tal conclusão.

Por outro lado, o humor grassa por toda produção publicitária e por vezes em tom excessivo. Portanto, uma contestação dessa natureza poderia parecer demasiadamente pretensiosa e sem sentido. Essa posição, no meu juízo, deve desconsiderar o cenário histórico, factual, para alguns, segundo o qual a imprensa nacional tem e expressa sempre que pode, suas inegáveis preferências partidárias e ideológicas — e possui, além disso, um certo traço reacionário.

A escolha do tema da campanha não poderia ter sido mais infeliz, qualquer que seja a intenção subjacente. Promover-se as custas da detratação alheia pode ser de alguma valia quando é notório o valor do objeto detratado. Faz diferença comparar-se a Nero ou a um vagabundo anônimo na sarjeta. Porém, se de saída identificamos no alvo da comparação algo sem importância e até risível, como pode essa ação denotar senão mesquinhez? Ou mais do que isso, a intenção implícita de injuriar escamoteada sob o aparente desejo de sobressair. Talvez sejamos tolos ao acreditar que foi uma escolha infeliz, posto que a dúvida sempre cultivará simpatizantes ao mesmo tempo que esconde seus objetivos. Não poderíamos imaginar método mais eficaz. Como naqueles filmes em que um cinematográfico ataque terrorista oculta a ação de assalto bilionário.

Ambas as posições parecem inconclusivas, porém, parece razoável manter-se atento à possibilidade de investidas contra a blogosfera. Eu ajuizo que o debate promovido na internet, especialmente na blogosfera, teve papel importante nos rumos da eleição do ano passado. Por essa razão os candidatos trataram de produzir vídeos destinados aos membros de comunidades no Orkut (que é um terreno onde repercutem matérias da mídia impressa, eletrônica e os pensamentos dos próprios leitores). Portanto, não parece sensato permitir que um argumento tão aristocrático se apresente sem constrangimento e que os veículos oficiais de imprensa acreditem e infundam a idéia de que são os únicos que podem tratar com alguma credibilidade dos temas que abordam — nada mais antidemocrático. E apesar de tudo, nada mais coerente com a posição histórica de grande parte da imprensa.

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