Absurdo crescente

A

Se você acha que a situação envolvendo o caso Daniel Dantas — operação Satiagraha — não pode ficar pior, se engana. Foi adiado hoje o julgamento do pedido de afastamento do juiz Fausto De Sanctis do caso. O juiz, de postura mais comedida, tem sido alvo de dogmáticos pareceres técnicos — de juizos que, mesmo para leigos, não oferecem suporte para suas conclusões, manifestando apenas um ranço estranho à atividade judicativa de um tribunal de última instância. O delegado Protógenes, mais falador, foi eleito alvo preferencial. Os ataques são sincronizados e até ganharam uma sofisticação de última hora. Escreve a Folha:

Na semana passada, ao criticar a busca e apreensão que sofreu em sua casa, Protógenes se disse vítima de uma perseguição movida por um “banqueiro bandido” e afirmou que o juiz condenaria o banqueiro.

A Folha apurou que essa declaração do delegado desagradou a De Sanctis, que a interpretou como uma ingerência sobre seu trabalho.

Apurou como? O G1 traz outra informação, sem o véu de uma “apuração” suspeita. Primeiro, relata a declaração de Protógenes:

Com certeza a decisão do juiz Fausto De Sanctis será pela condenação. Eu investiguei, sei que os dados estão consolidados relativos a corrupção e tenho certeza que ele vai dar uma sentença à altura.

Depois, a declaração do juiz sobre a possibilidade de afastamento e sobre a opinião emitida pelo delegado:

Procurado pelo G1, o juiz Fausto De Sanctis disse, por meio de sua assessoria, que não comentaria as declarações do delegado sobre seu possível afastamento. Sobre uma eventual condenação de Daniel Dantas, o juiz informou que a afirmação reflete apenas a opinião do delegado Protógenes.

A expectativa de Protógenes é baseada na documentação que ele amealhou ao longo da investigação e no perfil do juiz De Sanctis, que tem se mostrado imune aos pesados ataques que sofreu. Imaginar que um juiz do escol de De Sanctis se prestaria a interpretar tão grosseiramente as declarações de Protógenes é um enorme disparate. Como, afinal, a expectativa se constituiria numa ingerência ao seu trabalho? Esta interpretação parece mais uma nova e sútil estratégia: criar uma intriga no interior do bloco anti-Dantas a fim de enfraquecer ainda mais a força já combalida que ameaça o banqueiro. A julgar pelo silêncio do grosso da população, pelo visto, as estratégias tem sido eficientes.

Vamos aguardar atentamente os próximos capítulos dessa novela. A propósito, convém ler a opinião do ex-ministro da Justiça, Fernando Lyra:

Terra Magazine – O que o senhor acha dessa possibilidade de indiciarem o delegado Protógenes Queiroz?
Fernando Lyra – A causa fundamental de todo esse processo não está sendo apurada, que é o Daniel Dantas. Porque tudo isso aí decorre da prisão de um homem importante no contexto político e econômico do processo. E essa divisão da Polícia Federal tinha que ser resolvida internamente e não publicamente.

O senhor enxerga uma certa inversão de valores no fato de o delegado estar próximo de ser indiciado?
Claro. Isso é um absurdo. Tiraram o foco do Daniel Dantas para o Protógenes.

Atualização: Opinião de Wálter Maierovitch sobre o comportamento dos ministros no julgamento do HC concedido a Daniel Dantas:

O irado ministro Peluso, — meu antigo colega de Justiça paulista —, invocou, para tanto, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, concebida, — e ele bem sabe disso —, na ditadura Geisel e com a meta de calar os juízes. Uma lei que, ao cercear a livre manifestação do pensamento e o direito de se expressar, não foi, no particular e como qualquer rábula de porta de cadeia sabe, recepcionada pela Constituição de 1988.

Sintomático, não?

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