Daniel Dantas: o catalisador da justiça no Brasil

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Ilustração do Angeli

Após a prisão de Daniel Dantas surgiram discussões e propostas quase inéditas envolvendo garantias constitucionais, direitos individuais e outros perigosamente violados pela ação da Polícia Federal e dos envolvidos na operação Satiagraha. Algumas questões que vieram à tona:

1. O uso de algemas
2. A legitimidade das inteceptações telefônicas
3. Decisão do Supremo de impedir a execução penal provisória
4. Súmula que garante aos advogados acesso a informação sigilosa

Sem falar numa discussão que pairou brevemente sobre a pretensa inviolabilidade dos escritórios de advocacia.

Por onde andaram, nos últimos 20 anos, os que hoje lutam com unhas e dentes em favor de supostas garantias? Bem longe, eu imagino. Cairam de paraquedas no país logo depois da prisão do ensaboado Daniel Dantas. Ao contrário do que se imagina, o exame das questões acima não envolve domínio técnico. As prescrições constitucionais, relativas a alguns desses tópicos, são claras. A Constituição não oferece razões para descumprir aquilo que ela exige que se cumpra, salvo no caso em que as exceções estejam discriminadas. A crítica portanto não deve partir do terreno estritamente jurídico.

Mas temos o direito de ignorar a contiguidade entre a prisão de Daniel Dantas — não só como um evento jurídico, mas como fenômeno político — e a pronta atenção que questões estreitamente ligadas ao seu processo receberam? Devem ser esquecidas as “facilidades” que o acusado disse encontrar na mesma Corte que o libertou por duas vezes, através da ação de um personagem que rasgou códigos de ética a fim de vir a público defender suas decisões, além de ter dado cobertura a uma história que além de falsa, ofereceu suporte a acusações que não se espera de um profissional do Direito, isto é, de alguém que sabe — ou deveria saber — que é preciso fundamento para acusar?

Podemos fingir que os episódios que se seguiram à captura de Dantas foram simples acasos, nada além de coincidências? É óbvio, as ações não são diretas, mas o desgaste a que se submete o Supremo sempre que precisa analisar casos como o de Pimenta Neves é evidente. As propostas vêm no sentido de evitar uma intervenção direta do Supremo em circunstâncias semelhantes; todas elas, digam ou não respeito a Dantas, tocam os aspectos mais controversos da Satiagraha. Os criminosos ricos, como sempre, estão protegidos pelo mar de protelações a que seus advogados recorrem para salvá-los, as autoridades, na outra parte, querem proteger-se do desgaste constante de ter que livrar bandidos ricos.

A legitimidade das questões acima não é absoluta. Ou será que temos poucas razões para suspeitar de manobras políticas em favor de Dantas? Apesar da positividade das leis, não se pode ignorar a ação dos agentes e operadores envolvidos na sua execução. Por consequência, não se deve ignorar a “intenção” do horizonte de uma análise ética e política da atuação do Judiciário, especialmente quando contamos com tantos elementos para, no mínimo, suspeitar. Com pouco menos Gilmar Mendes decretou uma “crise institucional” e insinuou que instituições públicas e magistrados o estavam perseguindo.

A legitimidade não é resposta às nossas suspeitas e dúvidas. Não, pelo menos, até que alguém explique as estranhas “coincidências”.

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