AH, só Drummond pode nos aninhar novamente no abrigo de uma humanidade que só encontra coerência na desventura que partilha. E soa tão doce esse prazer de ser irmanado em desgraça, não? Como o zeloso melancólico que se esmera em manter seu mórbido sentimento. Lembro de uma frase do Cortázar (Válise de Cronópio) que dizia algo cujo teor minha traiçoeira memória reconstitui da seguinte forma:
Sozinhos, após nos livrarmos da ilusão de que não estamos sós, não seremos os únicos a nos sentir tão sozinhos.
A frase não é exatamente essa, mas esse é seu sentido. Tenho também a impressão de que ela é uma referência a outro autor (já que o Valise de Cronópio é um livro que trata de literatura). Pouco importa! Segue o poema do Drummond:
Consolo na praia
Vamos, não chores.
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento…
Dorme, meu filho.
Sinto-me tão piegas colando poeminhas aqui! Mas também não importa.